quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Realidade ou ficção? Eis a questão!

Quando fui à editora, assinar o contrato do meu primeiro livro, conheci uma pessoa muito interessante. Escritora às vésperas de lançar seu primeiro livro, assinando seu contrato no mesmo dia que eu. A burocracia acabou rapidamente e eu, com minha mania de puxar papo, perguntei sobre o livro dela. Nós começamos a conversar. Foi aí que descobrimos inúmeras afinidades, começando pela faculdade na qual estudamos e passando pelas mesmas manias de poetisa, como gostar de escrever à noite, dormir sempre com um bloquinho e caneta à cabeceira – e por vezes acordar para escrever – além da mania de beber vinho e escrever compulsivamente. Mas estou aqui para falar de outra afinidade com a autora. E, como estou apenas começando a freqüentar eventos poéticos, imagino que muito em breve encontrarei mais poetas que passaram pelo mesmo que nós. Falo da dificuldade dos nossos leitores de separarem a ficção da realidade.

Foi nesse dia que percebi como é comum os leitores confundirem aquilo que escrevemos com o que estamos sentindo ou vivendo no momento. É impressionante! Parece até aquela confusão que muita gente faz ao se deparar, na rua, com um ator que está vivendo um papel de vilão na televisão. Como se ele fosse o personagem 24 horas do dia. Só que aí tem um diferencial. Confundir as dores e alegrias dos poemas e contos com as dores do escritor é quase o mesmo que confundir, por exemplo, todas as características de todos os personagens de novela com as características reais de seu autor. Já pensou que loucura? Se fosse assim, os autores de novela seriam as pessoas mais vividas do mundo, não é mesmo? Como é que podem ter vivenciado tantas experiências diferentes num só corpo, numa só vida?

Outro dia, ri muito ao ouvir a pergunta de um amigo que lera meu conto chamado “Juliana e o coelho”, que fala de um casal formado por uma mulher que usa vibrador e um homem que usa uma boneca inflável. Muito sem graça, e já pedindo desculpas antecipadamente por sua curiosidade, ele indagou: “Mariana, o seu marido tem uma boneca inflável?” Gente! O que responder a uma pergunta dessas? Pausa para rir. Recobrado o fôlego, expliquei: “Nem tudo o que a gente escreve é a nossa realidade.” Às vezes a gente inventa, às vezes a gente recria uma história de um conhecido, às vezes a gente até escreve o que nos aconteceu, mas, na maioria das vezes, a gente realiza na escrita tudo aquilo que a gente nunca viveu, afinal, escrever é isso. É realizar o que não vivenciamos na prática, é protesto, auto-análise, é brincar de faz de conta. E como eu escrevo muita coisa erótica, confesso: essa não foi a primeira vez em que fui indagada sobre a coerência da minha escrita com a minha realidade.

É mesmo muito bom saber que nosso texto desperta tanto a curiosidade alheia. E mais: quando se fala de erotismo, gera-se ainda muita polêmica e hipocrisia. E eu adoro isso! Principalmente porque é exatamente nessas ocasiões em que me sinto tocando quem mais pode se beneficiar com a minha literatura, se é que alguém pode se beneficiar com ela... Como as pessoas que ficaram chocadas com minha tristeza em alguns poemas ou com minha devassidão e pornografia em outros escritos. Essas são as mesmas pessoas que são assombradas por dores terríveis e/ou perseguidas por sonhos eróticos altamente “pecaminosos”, na sua visão curta do que seja pecado. Afinal, quem tem tanto medo de tristeza, no fundo, é triste. Quem é alegre o tempo todo não se deixa abater por um poema triste, não é mesmo? Aliás, quem é alegre o tempo todo? Quem tem pena do poeta que sofre não tem noção de como é ele próprio o digno de pena. Reconhecer o próprio sofrimento e transformá-lo em poesia não é sofrer mais. É lidar com a vida de maneira madura. É saber se olhar no espelho. Botar para fora os fantasmas. Trazer à luz da consciência aquilo que estava preso e escondido na escuridão do inconsciente. Quantas vezes eu não sofri com algum sentimento até ser curada pela poesia? Foram inúmeras as ocasiões em que eu, apenas depois de escrever um poema, consegui enxergar finalmente os meus traumas, medos e problemas a serem solucionados. É como se o poema me acendesse uma luz no fim do túnel. E o mesmo acontece na escrita erótica. Quando escrevemos sobre sexo, acendemos nossa libido. Botamos fogo no coração. E isso é ótimo! Quem tem uma vida sexual ativa é mais feliz. E mais: quando escrevemos sobre sexo, sem querer, abrimos algumas portas do inconsciente. Despertamos desejos internos até então desconhecidos, vontades que estavam escondidas, com medo de se mostrarem... Por isso, meu conselho para quem se comove demais com as dores do poeta ou para quem fica chocado com as palavras dele sobre sexo, é um só: escreva também. Você vai ver como é bom. Se preferir, não precisa mostrar pra ninguém. Tudo bem. O que importa é você escrever com o coração, botar pra fora os próprios fantasmas e depois ler com calma e analisar racionalmente o que foi escrito. Você vai se sentir muito mais livre e vai se surpreender com o que sua mente é capaz de fazer. Palavra de escritora!

5 comentários:

Anônimo disse...

Acabou que este é um dos meus textos preferidos entre os que li neste blog!

Pachá disse...

Nem tudo que a gente escreve é verdadeiro, mas sempre tem um pouco da nossa vida.
Beijos.

Babi disse...

Muito bom e verdadeiro!
Bjs!
Babi

Beth Valentim disse...

adorei mariana...como sempre arrasa em suas palavras simples e que tocam a alma...muitas vezes tão superficialmente, que só depois de dias observamos suas ações e reações em nós...essas são as mlehores intenções de uma escritora...
a proposito, se for realidade eheheh me diz o nome do livro e editora, por favor...
bjks querida
beth valentim

Unknown disse...

"Menininha" surpreendente!