quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

O ano novo e a velha maluca

Todo final de dezembro, o menino ouvia a mesma ladainha: "Te desejo um feliz ano novo, com muita saúde, paz e amor." E era sempre como se fosse mágica. A partir do primeiro minuto do dia primeiro de janeiro, tudo seria diferente. Pá-pum. Que nem os fogos da festa na praia. Mas o tempo foi passando, os anos avançando e o menino não via mudar nada. "Vai ver é uma tradição doida de adulto", ele pensou, que nem as ordens que vivia recebendo, mas que sempre vinham sem um porquê. "Por que eu não posso tomar banho depois de comer?", perguntava. "Porque tem que ser antes",  respondiam. "Mas por quê?", ele insistia. "Porque tem que ser assim, ora bolas! Agora trate de tomar banho pra poder almoçar". E lá se ia o menino fazer mais uma vez o que lhe mandavam.

Até que um dia conheceu uma velha maluca. Quer dizer, maluca pro resto da família - leia-se: pros adultos - porque pra ele e pros primos ela era muito legal, isso sim. Tinha seus oitenta e tantos anos (nem parecia!) e nunca tinha casado, mas teve dois filhos. Nenhum adulto gostava de explicar essa parte. Eles gostavam era de falar mal da coroa gente boa. "Ela é doidinha, tadinha", "ficou pra titia", e por aí vai. O menino dizia: "Mas ela é mãe, não é tia!" e nada. Nessas horas, eles tiravam da cartola aquela indefectível cara de "eu sei tudo, mas não vou te contar" e, com um sorrisinho de canto de boca muito do besta, continuavam o papo como se nada tivesse acontecido. Mas o fato é que foi a velha maluca quem mudou tudo o que o menino e os primos pensavam sobre esse tal de ano novo.

Quando ele foi desejar tudo aquilo de praxe para a senhorinha, ela lhe deu uma baita bronca. No começo, o menino ficou chateado, afinal ele só falava esse tipo de coisa pra quem gostava muito. "Que ingratidão", pensou. Mas a coroa explicou: "Meu filho, meus filhos", estendendo o papo à primarada, “eu não preciso que fiquem me desejando nada. Por acaso sou aleijada? Sou incapaz? Eu mesma vou garantir que meu ano seja maravilhoso. Não fico esperando cair nada do céu. Acaso alguém já lhe desejou que você dormisse, acordasse e tomasse banho todo dia ou você simplesmente vai lá e faz? Tem coisas que ninguém poderá fazer por você. A minha felicidade é tarefa minha."

Os meninos estavam olhando pra ela meio abobalhados, ainda absorvendo aquilo tudo, quando um deles indagou: "Mas então, o que a gente pode desejar de bom pra senhora?" A dona moça botou um sorrisão na cara e disparou: "Essa é fácil. Vocês podem desejar que eu esteja bem pertinho de vocês durante o ano todo, porque isso vocês podem fazer por mim e vai me dar uma alegria danada, só pra começar. Vocês também podem desejar que o governo pare de roubar, que os hospitais públicos ganhem mais médicos e infra-estrutura..." e, dito isso, a velhinha olhou pras carinhas intrigadas a sua volta e emendou: "é, meninos, isto já é outra história, pra quando vocês forem maiores...". Foi nesse momento que o menino olhou encantado pra vovozinha e falou bem alto e feliz: "Pro próximo ano, desejo que a senhora venha morar comigo". E não é que os primos todos danaram a dizer que queriam o mesmo?

2 comentários:

figbatera disse...

Bacana!
Sou seu fã, Mariana, e vou seguir vc aqui tb, além do Facebook.
bjs.. (ah, e "feliz ano novo".....kkk)

Mariana Valle disse...

Feliz ano novo pra você também, Figbatera! No facebook seu nome não é esse...

Bjo!